Final de semana passada, recebi convite pra ir à casa do meu amigo Jacir, nos conhecemos de quando morávamos na roça. Desde que se foi, nunca mais nos encontramos. Perdemos por completo nosso contato. Sua família aproveitando o grande êxodo rural, mudaram-se para Jundiaí. Foram trabalhar na empresa de concentrados de tomates Cica.
Se para mim, os anos deixaram marcas indeléveis, percebi ao abraçar meu amigo que suas marcas eram mais profundas que as minhas. Ele não era nem sombra daquilo que fora no passado. Tinha envelhecido, nos olhos uma tristeza que apagou o brilho de antigamente. Convidou-me para entrar e em seguida me apresentou o casal de filhos e começou a contar sua história.
Disse-me que todas as famílias que moravam na roça, se mudaram para o mesmo bairro na cidade grande. Foi muito interessante essa união. Quando alguém tinha algum problema, por se conhecerem, se sentiam tranquilos em pedir favor e, assim, iam tocando a vida. Inclusive, facilitava até para os rapazes e moças na hora de escolherem alguém para namorar.
E continuou dizendo que o trabalho na fábrica era muito diferente daquele que ele estava acostumado. Na roça, não tinha que bater o ponto. Ele que tinha o habito de conversar com os companheiros de jornada enquanto trabalhava, estranhou que ali, não podia nem olhar dos lados. Muitas vezes pensou em voltar. O tempo foi passando e ele se acostumou com aquela vida de acordar de madrugada, levar a marmita e o que mais o deixava encabulado: tomar duas conduções para chegar ao destino. Odiava a ideia de que tinha que comprar frutas e verduras. Na roça tinha tanto que até apodrecia no pé.
Numa manhã, na fila para bater o ponto, alguém tocou de leve seu ombro. Se virou para ver quem era. Qual foi sua surpresa ao reconhecer de imediato sua amiga de infância lá da roça. Trocaram cumprimentos e marcaram de almoçar juntos no refeitório. Na hora ele sentiu estremecer o corpo diante de moça tão bela. A última vez que viu Tereza, ela não passava de uma menina. Agora estava moça formada. Grandes olhos negros, a pele morena. Quando se abraçaram, sentiu o leve toque de perfume. Como está linda a Terezinha, pensou.
Para encurtar a prosa, disse-me ele, em seis meses nos casamos. Éramos um casal perfeito. Logo vieram os dois filhos que te apresentei. A vida melhorou, compramos casa financiada do governo e também um carro para que Tereza levasse as crianças à escola.
Na mesma rua que a nossa, mudou uma família onde tinha um rapaz solteiro. Foi a nossa desgraça. Certo dia, ela foi levar as crianças a escola e não voltou mais. Ficamos todos apavorados pensando que ela tinha sido sequestrada ou algo assim. A polícia fez buscas incansáveis sem sucesso. A família do rapaz solteiro logo se mudou de lá. Foram anos de angústia sem notícias da minha mulher. Não sabemos se está viva ou morta! As crianças cresceram e aos poucos foram se acostumando com a falta dela.
Entrou no quarto e de lá, trouxe um retrato desbotado de sua Tereza. Seus olhos estavam ainda mais tristes.