A reportagem do A Cidade conversou com Keila Fiuza dos Santos Silva sobre sua caminhada no futebol
Keila Fiuza dos Santos Silva com a camisa do Clube Atlético Votuporanguense (Foto: Leandro Barbosa)
Daniel Marques
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Chama a atenção dos torcedores toda vez que uma jovem entra em campo com o rosto pintado, carregando não apenas a força de sua raça, mas também a representação viva de sua cultura. Essa jogadora é Keila Fiuza dos Santos Silva, de 17 anos, conhecida entre as companheiras e comissão técnica do Clube Atlético Votuporanguense simplesmente como Índia ou Indiazinha.
Integrante do elenco sub-17 feminino que disputa o Campeonato Paulista da categoria, ela leva para os gramados o seu talento e a identidade de seu povo. A jovem nasceu na Aldeia Morro Falhado, pertencente à etnia Xacriabá, localizada no município de São João das Missões, no norte de Minas Gerais, e traz consigo a essência de uma história que une tradição e esporte.
Em conversa com a reportagem do jornal
A Cidade, a atleta lembrou que sua relação com o futebol começou cedo, aos 10 anos, quando ainda jogava com os meninos em um campo de terra. Foi nessa época que despertou o amor pelo esporte que hoje a faz sonhar com a carreira profissional. Dentro de campo, ela se mostra uma jogadora polivalente, capaz de atuar em praticamente qualquer posição defensiva do meio para trás, mas não esconde que sua preferência é jogar como volante, posição em que consegue unir marcação e força.
O primeiro campeonato oficial que disputou foi no ano passado, quando defendeu o Operário-MT e conquistou o título estadual mato-grossense sub-17. Já em Votuporanga, representando a equipe da Secretaria de Esportes e Lazer, Keila foi vice-campeã dos Jogos Regionais e garantiu uma medalha de bronze no estadual sub-17, experiências que fortaleceram sua confiança e abriram caminho para novos desafios.
Morando em Votuporanga desde o ano passado, a jovem atleta celebrou a oportunidade de fazer parte do primeiro time feminino da história do Clube Atlético Votuporanguense, fruto da parceria do treinador Alcir de Camargo, o popular Tilim – grande incentivador do futebol feminino na cidade –, com a Alvinegra. Para ela, essa iniciativa pode ser o início de uma transformação no cenário esportivo local. “O nosso sonho é que o CAV dê continuidade no projeto do futebol feminino”, comentou, reforçando a importância da manutenção e crescimento da modalidade.
Entre os elementos que mais chamam a atenção durante as partidas, está a escolha da Indiazinha por entrar em campo com o rosto pintado. Segundo ela, essa decisão surgiu de maneira espontânea e, hoje, já faz parte de sua rotina nos jogos. “Eu faço questão de apresentar a minha cultura, representar o meu povo”, afirmou. Cada traço no rosto carrega consigo um pedaço da Aldeia Morro Falhado, reafirmando a resistência e o orgulho de sua origem.
Em sua terrinha, Keila tinha aula de cultura, em que aprendia, entre outras questões, sobre as pinturas. “Desde mais ou menos os 14 anos eu me pinto, mas no começo eu tentava, e às vezes errava; então eu voltava e tentava novamente. Depois, com 15 anos, mudei para a cidade por causa do futebol e fui melhorando nessa questão da pintura”, revelou.
Questionada se já sofreu preconceito ou ouviu “piadinhas” de adversárias pelo fato de expor sua identidade indígena dentro de campo, a Índia respondeu que nunca passou por esse tipo de situação. Pelo contrário, sente-se acolhida e fortalecida. “Me sinto muito feliz em estar ali representando o meu povo. É muito orgulho”, acrescentou. Sua presença se tornou símbolo de representatividade para todos que acreditam no poder do esporte como ferramenta de inclusão e valorização cultural.
Assim como tantos outros meninos e meninas que espalham pelo Brasil o desejo de transformar o talento em profissão, Keila alimenta o sonho de se tornar jogadora profissional. Com sua história, ela mostra que o futebol pode ser também um campo de resistência e identidade, onde cada gol, cada desarme e cada passe carregam o peso de uma cultura inteira.