Em 1914, ocupando a tribuna do Senado, na qualidade de Senador a República, e ex-Ministro da Fazenda do Governo Provisório do Mal. Deodoro da Fonseca (1889-1891), Rui Barbosa proferiu o seguinte discurso, que peço licença para reproduzir, na íntegra:
“A falta de justiça, Srs. Senadores, é o grande mal da nossa terra, o mal dos males, a origem de todas as nossas infelicidades, a fonte de todo nosso descrédito, é a miséria suprema desta pobre nação.
A sua grande vergonha diante do estrangeiro, é aquilo que nos afasta os homens, os auxílios, os capitais.
A injustiça, Senhores, desanima o trabalho, a honestidade, o bem; cresta em flor os espíritos dos moços, semeia no coração das gerações que vêm nascendo a semente da podridão, habitua os homens a não acreditar senão na estrela, na fortuna, no acaso, na loteria da sorte, promove a desonestidade, promove a venalidade, promove a relaxação, insufla a cortesania, a baixeza, sob todas as suas formas.
De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto.
Essa foi a obra da República nos últimos anos. No outro regime, o homem que tinha certa nódoa em sua vida era um homem perdido para todo o sempre, as carreiras políticas lhe estavam fechadas. Havia uma sentinela vigilante, de cuja severidade todos se temiam e que, acesa no alto, guardava a redondeza, como um farol que não se apaga, em proveito da honra, da justiça e da moralidade.”
O que dizer mais? O que me espanta é que esse discurso, proferido há quase cem anos, retrata tão bem (e ainda) o Brasil de hoje! Parece que o grande jurista Rui Barbosa era partidário da Monarquia, e se referia nesse momento ao Imperador Dom Pedro II, como a “sentinela vigilante”, que “guardava a honra” da nação brasileira.
Entretanto, suas palavras contêm tanta verdade, tanta certeza, refletem tanto e tão precisamente o Estado brasileiro moderno e a política praticada no Brasil, desde então, e hoje, e sempre, que me dá medo e desespero.
Por exemplo, um homem como o Antonio Palocci, guindado por duas vezes ao centro do poder da República, teve sempre seu nome ligado a escândalos e denúncias gravíssimas, que comprometem sua honra e sua moral, e é, no entanto, defendido com unhas e dentes por seus pares, e posa de bom moço, enquanto isso.
Quem, dentre os trabalhadores honestos de qualquer país, consegue multiplicar tão rapidamente e tão escandalosamente seu patrimônio pessoal? Tirando os gênios da internet e os inventores revolucionários que vendem suas ideias fantásticas, quem mais, a não ser os traficantes de drogas, os ditadores, os corruptos e ladrões de casaca e colarinho branco, salvo engano e melhor juízo?
A injustiça campeia no Brasil, enquanto a justiça é cega, surda, e, também, parece que acometida de paralisia. Ele renunciou ao cargo de ministro, pela segunda vez. Mas, ainda assim, isso não apaga a nossa Vergonha!
Para culminar, ainda temos o caso de Cesare Batistti, livre, leve e solto por aí, circulando sem visto de entrada no Brasil! Não bastasse a grave afronta às leis que regem a entrada e permanência no país a estrangeiros, descumprimos também o tratado internacional de extradição a procurados pela justiça, perante o governo italiano.
Vergonha, vergonha, vergonha!
Norma Moura é advogada - kairosbrinquedos2009@hotmail.com