Há quem pensa que liberdade é descompromisso, não estar preso a nada. Grande equívoco. Ser livre é se doar, é participar, é ajudar, é ceder um pouco de si mesmo em prol do coletivo, é não ficar deitado aguardando para tirar proveito do esforço alheio. Liberdade é um bem que precisa ser conquistado, e dá trabalho. Depois é preciso manter. E dá mais trabalho ainda. A renúncia à liberdade, em muitos casos, é a fuga da responsabilidade. Conquanto seja sinônimo de vontade, coragem, ação, a liberdade não imuniza contra revezes, frustrações. Tem seu custo, como tudo na vida. Entretanto, quem é realmente livre banca esse custo, não se esconde, não tira o corpo fora, não se importa de ouvir o que não quer, não dá bola para cara feia. Quem é livre enfrenta, fala a verdade, não teme se expor, leva tombos, toma pancadas, recebe ofensas, sai alquebrado, machucado, injuriado, etc. das batalhas, mas... continua livre. A liberdade está na alma. E incomoda muita gente. O mundo é de todos, mas tem quem se acha mais dono, e isso é causa de muita injustiça. Para lidar com essa gente é preciso ser livre, não ter medo de bordoada. “O que mais preocupa não é o grito dos violentos, nem dos corruptos, nem dos desonestos, nem dos sem ética: é o silêncio dos bons” (Martin L. King). Quem é livre não se omite perante as injustiças, mas tem muito bem definida na mente a diferença entre o justo e o injusto, sabe que radicalismo, fanatismo, extremismo e afins nada têm a ver com liberdade e justiça.
O ser humano é livre para realizar, amar, ser feliz. Muita gente, todavia, não se solta, não ama, não é feliz. Por quê? Medo. O maior obstáculo entre a pessoa e o seu objetivo é o medo do oposto do que ela deseja. A grande barreira à felicidade é o medo de ser infeliz. Joga-se fora a possibilidade de ser feliz quando, com medo de ser infeliz, se deixa de fazer o que é preciso para alcançar a felicidade. Teme-se procurar o ‘sim’ e encontrar o ‘não’, atirar-se para a vida e cair no lugar errado. Em muitos casos, o oposto mora ao lado. Mas viver é correr riscos. Quem não arrisca... Para vencer o medo é preciso mudar, transformar o medo de errar em uma vontade ferrenha de acertar. O querer acertar tem de ser imensamente maior do que o temer errar; a vontade de amar, muito maior do que o medo de sofrer. “O medo de amar é o medo de ser livre para o que der e vier/ Livre para sempre estar onde o justo estiver/ O medo de amar é o medo de ser/ De a todo momento escolher, com acerto e precisão, a melhor direção/ O medo de amar é não arriscar/ Esperando que façam por nós o que é nosso dever...” (Beto Guedes e Fernando Brant).
Matéria da Veja de 20/4/11 revela que os homens estão adiando cada vez mais o casamento, deixando para começar a pensar nele depois dos quarenta. Querem, dizem, esticar ao máximo a solteirice, ser livres para cuidar de si e do trabalho. Descartam, porém, a ideia de envelhecer sozinhos. Ou seja, casamento e filhos ficam para depois como se fossem sinônimo de perda de liberdade. Dá mesmo a impressão de que é preciso primeiro viver a vida para depois se preocupar com isso, como se quem é marido e pai não tivesse liberdade, não tivesse vida. Vejo um equívoco nesse modo de pensar. Casamento e filhos, além de propiciar maior realização pessoal, não impedem o progresso profissional; digo isso por mim e por um monte de gente. Uma coisa não anula a outra. Casar e ter filhos é preencher, é muito mais do que uma tábua de salvação para o fim da vida, mais do que algo a que se apega para não envelhecer sozinho. Há maior densidade na vida do homem que compartilha seu tempo e espaço com mulher e filhos. E responsabilidade também. “Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas” (Saint Exupery). Bom marido precisa conquistar dia a dia a mulher; bom pai é ser espelho para os filhos. Ter filhos mais cedo é ganhar mais tempo para conviver com eles e dar-lhes mais tempo para terem pai. Antes de um pai endinheirado, o filho quer um pai. A menor diferença de idade entre pais e filhos constitui uma vantagem para ambos. Muitos desses homens que vão ser pais perto dos cinquenta certamente se arrependerão; ao constatarem o que realmente vale a pena na vida, vão pegar-se desejando ter vinte ou trinta anos a menos para curtir como gostariam seus rebentos. Quanto mais se abraça a vida, ao invés de fugir dela, mais se é livre. Sonhar junto é viver o sonho. Raul Seixas, em “Prelúdio”, canta: “Um sonho que se sonha só/ é só um sonho que se sonha só/ mas sonho que se sonha junto é realidade”.
Paulo Pereira da Costa, promotor de Justiça, autor do livro “Pensando na Vida” paulopereiracosta@uol.com.br