A seriedade e a transparência marcam, sem sombra de dúvida, o trabalho da imensa maioria dos profissionais de saúde atuantes na vigilância epidemiológica e no controle de doenças pelo SUS (Sistema Único de Saúde). Por isso as autoridades de saúde são as primeiras a emitir o alerta quando há, de fato, um problema que demande ações urgentes e até planos de contingência.
Isto aconteceu no ano passado com a gripe A H1N1, que mobilizou centenas de países. Do mesmo modo ocorreu com a rubéola, cujo crescimento de casos e o risco de provocar a síndrome da rubéola congênita, levaram o país a realizar uma grande campanha de vacinação em 2008 e com o sarampo, alvo de imunização em massa no início da década para manter a doença erradicada no Brasil.
Esta não é, no entanto, a situação da varicela, popularmente conhecida como catapora. Nas últimas semanas foi alardeado o crescimento da transmissão de varicela no Estado de São Paulo e o desabastecimento da vacina contra a doença. Embora a situação epidemiológica atual seja semelhante ao observado nos últimos anos, é preciso esclarecer alguns fatos.
Em primeiro lugar, a doença, a despeito da alta contagiosidade, não está incluída na lista de notificação compulsória no país. No estado de São Paulo, desde 2002, realiza-se o monitoramento de surtos visando conhecer o comportamento da doença e a adoção precoce de medidas de controle, especialmente na ocorrência em hospitais e creches.
A catapora é doença disseminada pelo mundo, considerada benigna na maioria dos casos, apresentando maiores incidências nas crianças. A mortalidade é baixa, estimada em menos de 2 casos por 100.000 doentes.
Segundo, a vacina contra varicela ainda não faz parte do calendário de imunização de rotina do SUS (Sistema Único de Saúde), definido pelo Ministério da Saúde. Está disponível no sistema público, durante todos os meses do ano, em Centros de Referência para Imunobiológicos Especiais (CRIE) para grupos de risco pré-definidos, geralmente pessoas imunocomprometidas. Apenas no estado de São Paulo o produto é utilizado para o controle de surtos em creches, através da vacinação de crianças até cinco anos.
O terceiro ponto é que, embora a doença ocorra durante todo o ano, caracteristicamente apresenta maiores taxas de transmissão nesta época em nosso país.
Dados do monitoramento realizado pela secretaria de estado demonstram que a situação epidemiológica da varicela no estado de São Paulo não é diferente da observada ao longo desta década, e certamente similar à ocorrência em outros estados. O ano de 2003 foi aquele com o maior número de registros totalizando mais de 51,6 mil casos, seguido pelos anos de 2005 e 2006 com 29,6 mil e 18,5 mil casos respectivamente. Em 2010, até 14 de setembro, foram notificados 10.018 casos de catapora no Estado de São Paulo, número superior apenas ao registrado em 2009, mas inferior a todos os outros anos desde 2003.
O sistema de vigilância identificou 15 óbitos em 2010, sendo o maior número em 2003 quando ocorreram 60 óbitos e o menor em 2009 com 7 casos registrados. Não há evidências de maior letalidade do que a conhecida pela história natural da doença e a descrita mundialmente.
É preciso destacar que o Centro de Vigilância Epidemiológica da secretaria de saúde divulga sistematicamente a ocorrência de casos da doença, não significando que somente no estado de São Paulo aconteça a transmissão da catapora.
A Secretaria de Estado da Saúde licitou 200 mil doses, com entrega parcelada, decorrente da não disponibilidade de entrega de todo este quantitativo de uma vez só, pelo laboratório produtor. A média de utilização do produto é de 100 mil doses ao ano.
No cenário atual, o aumento sazonal da ocorrência de casos e o desabastecimento de vacina até no setor privado promovem a falsa sensação de ineditismo e ressurgimento da doença.
A adoção de medidas simples como o afastamento dos doentes, já na detecção das primeiras lesões de pele, do contato com bebês, crianças, gestantes e pessoas imunocomprometidas, promoção de adequada e rigorosa higienização da pele e corte de unhas, evitar aglomerações, manter os ambientes ventilados, hidratação frequente e alimentação saudável favorecem a prevenção de complicações.
As Vigilâncias Epidemiológicas, estadual e municipais, estão atentas às ocorrências e, se houver alguma anormalidade, serão as primeiras a emitir o sinal amarelo.
Clelia Aranda, médica, é secretária-adjunta de Estado da Saúde de São Paulo