Quem poderá nos salvar? Lady Gaga! Curioso, não é? Centenas de pessoas acamparam por dias em frente ao Copacabana Palace para garantir um lugar privilegiado no show da cantora. Não era para um concurso público. Nem para uma matrícula em universidade. Era para ver Lady Gaga. Alguns chegaram a dizer que usaram fraldas geriátricas para não perder a vaga na fila. Assim, eu vi e ouvi pelas redes sociais com estes ouvidos que a terra há de comer. Mas, o que esse fenômeno nos revela? O culto às celebridades substituiu o culto ao conhecimento. Olha como isso é grave! Acorda-se de madrugada, com frio e fome, não para buscar um futuro melhor, mas para tentar ser notado por alguém que nem sequer sabe da nossa existência. Eu gostaria de ver essa mesma paixão direcionada a um livro, um debate respeitoso e rico em ideias, a um projeto social que tirasse mendigos da rua. E que tal fosse uma palestra sobre filosofia, espiritualidade ou ética? Mas não. Nos acostumamos com a anestesia do espetáculo. Com a devoção à imagem. Com o vazio embalado por aplausos. Que desespero, Meu Deus! Para mim, não passa de almas famintas de sentido. Historicamente, estamos na era da imagem. Um tempo em que parecer vale mais do que ser. Onde uma boa fotografia ou um vídeo bem editado têm mais impacto que a realidade nua e crua. A verdade, por mais simples ou dolorosa que seja, perdeu espaço para o espetáculo anestésico da aparência. Essa inversão de valores se intensificou e hoje somos filhos de uma cultura midiática que transformou a vida em palco e o indivíduo em personagem mediado pela imagem. O que não é visto, não existe e o que é visto, não precisa ser verdadeiro. Guy Debord, pensador marxista, defendia uma crítica radical à sociedade contemporânea, no livro “A Sociedade do Espetáculo”, profeticamente descrevendo o funcionamento das redes sociais, da cultura de celebridades e da política do marketing emocional. Em plena era dos influenciadores, reality shows e da “verdade alternativa”, Debord se tornou mais atual do que nunca. A vida se tornou uma representação com filtros, curtidas e algoritmos. A felicidade virou um produto e a dor, um conteúdo compartilhável. A verdade, um detalhe incômodo. Estamos anestesiados, viciados no brilho superficial das telas, na vida perfeita, na emoção pré-fabricada. Rimos, choramos, nos indignamos, tudo no tempo exato de um vídeo curto, antes de deslizar o dedo para o próximo. Não há tempo para profundidade. A dor real incomoda. A reflexão exige esforço. Melhor seguir no automático, aplaudindo imagens enquanto ignoramos a verdade que sangra nos bastidores. E assim surgem consequências inquietantes como as relações frágeis, discursos vazios, identidades fabricadas. A imagem vale mais do que o caráter. A viralização mais do que a veracidade. E, pouco a pouco, vamos perdendo o sentido da realidade. É urgente acordar desse transe e recuperar o olhar crítico, reaprender a ouvir, pensar, questionar, valorizar a essência, não a embalagem. A verdade pode não render curtidas, mas liberta. Pode não viralizar, mas transforma. Se um dia o espetáculo ruir não serão os famosos que sustentarão o mundo. Serão os que resistem ao vazio, os que pensam, os que leem incansavelmente, os que estudam sem palco. Então, antes de vestir a fralda geriátrica, vista a coragem de pensar, de ser lúcido e despertar para a real.