Religiosos conservadores e até algumas dioceses do país rejeitaram o texto-base da ação por tratar de assuntos sobre o público LGBTQIA+
A Diocese aderiu e lançou na Quarta-feira de Cinzas a Campanha da Fraternidade (Foto: A Cidade)
Franclin Duarte
franclin@acidadevotuporanga.com.br
Em meio à polêmica nacional envolvendo à Campanha da Fraternidade deste ano, que tem como tema “Fraternidade e Diálogo: compromisso de amor” e o lema “Cristo é a nossa paz: do que era dividido, fez uma unidade”, a Diocese de Votuporanga aderiu e lançou na quarta-feira (16) a iniciativa em uma missa realizada na Catedral de Nossa Senhora Aparecida. Em entrevista exclusiva ao
A Cidade, o padre Gilmar Margotto, responsável pela comunicação da Diocese, falou sobre a grande repercussão que o assunto tomou nos últimos dias.
A Campanha da Fraternidade é realizada pela Igreja Católica desde a década de 60, na Quaresma, período de 40 dias que antecede a Páscoa. Desde o ano 2000, porém, de cinco em cinco anos ela é ecumênica e organizada pelo Conic (Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil), que é composto pela Aliança de Batistas do Brasil, Igreja Católica Apostólica Romana, Igreja Episcopal Anglicana do Brasil, Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil, Igreja Presbiteriana Unida e Igreja Sirian Ortodoxa de Antioquia.
Foi deste conselho que surgiu o tema e onde foram preparados os materiais de divulgação que, para os mais conservadores, é visto como “muita militância e pouca religiosidade”. Isso porque traz reflexões sobre: Negação da ciência durante a pandemia de Covid-19; atuação do governo federal no combate ao coronavírus; igrejas que não respeitaram o distanciamento social; e a "cultura da violência" contra mulheres, negros, indígenas e pessoas LGBTQIA+.
Após a divulgação da cartilha, que é trabalhada com os fiéis nas igrejas, diversos grupos católicos se manifestaram contrários à campanha deste ano, bem como bispos de algumas dioceses declararam que não utilizariam o material em suas paróquias, como foi o caso do Arcebispo de Juiz de Fora/MG, Dom Gil Antônio.
“Neste ano, houve uma grave falha com relação ao texto-base que tem provocado séria polêmica, por apresentar conceitos duvidosos em relação à Doutrina Social e à Moral cristã, em sua redação e na sua subjacência, sendo a autora adepta de correntes morais não aceitas pela Igreja Católica e nem por grande parte dos nossos irmãos evangélicos”, destacou Dom Gil Antônio. “Sugiro para base de nossa reflexão quaresmal a Encíclica Fratelli Tutti e a Mensagem do Papa Francisco para a Quaresma”, acrescentou o Arcebispo de Juiz de Fora.
Votuporanga
Para falar sobre o assunto e a repercussão em todo o país, o jornal
A Cidade procurou a Diocese, que respondeu, por meio do padre Gilmar Margotto, responsável pelo setor de comunicação. Segundo ele, o colegiado da igreja, que é a CNBB, está de acordo com o texto, porém há uma minoria que vem alimentando preconceito e ódio, e a Campanha da Fraternidade vem falar justamente o contrário.
“Para que haja paz é preciso dialogar, respeitar e aceitar as diferenças. Então, a campanha deveria ser para construir pontes e não alimentar muros. A Quaresma tem sentido de conversão e uma pessoa verdadeiramente convertida busca o diálogo e não a exclusão e nem a diferença que dissemina o ódio”, disse o padre.
Ainda segundo o padre Gilmar, o material da Campanha da Fraternidade é baseado em quatro pilares: ver, julgar, agir e celebrar.
“Na parte do ‘ver’ a igreja apresenta a realidade, então hoje nós vivemos feminicídio, temos preconceito, problemas de vacinação, de negacionismo em relação à ciência, temas atuais que todos os dias nós encontramos pelos meios de comunicação, então nesse levantamento do ‘ver’ a equipe da campanha está mostrando a realidade que, se não é vista no texto-base, é visto através do rádio, do jornal, da TV e da internet. Não há uma invenção de nada, apenas um ‘ver’ da realidade”, completou.
Sobre o tema de maior polêmica, envolvendo o público LGBTQIA+, padre Gilmar disse que a igreja tem uma posição muito sólida e firme, mas acrescentou que precisa ter o “acolhimento de Jesus”.
“Se Jesus estivesse aqui ele ia trabalhar com a exclusão? Então precisamos ver a pessoa como um todo. Jesus Cristo veio para salvar o homem, então a proposta de salvação é igual para todos, na condição em que cada um está. Há essa abertura, pois o tempo exige essa abertura. Vejo uma igreja muito com os pés no chão e atualizada, uma igreja humana e divina, que é feita de homens e também do Espirito Santo, com a graça de Deus”, concluiu.
Objetivo
De acordo com a CNBB, a Campanha da Fraternidade tem como gesto concreto a coleta de recursos para apoio a projetos sociais relacionados à temática da campanha. Em 2019, o Fundo Nacional de Solidariedade distribuiu mais de R$ 3,8 milhões, atendendo a mais de 230 projetos. Em 2020, por causa da pandemia, não ocorreu arrecadação.